terça-feira, 17 de agosto de 2010
O crisântemo morreu de morte natural
Uma morte insidiosa - qualquer morte natural, se pensar bem - deixa-se observar apenas por um olhar minucioso, quase microscópico.
A verdade é que aquele crisântemo branco, tão branco quanto o branco dos meus olhos, com todo aquele ingênuo e latente desejo de margarida alcoviteira possuía sim uma beleza suave, ainda que fatalisticamente fadada ao fim.
Era falsa então aquela maciez acetinada das pétalas? - me perguntei. A altivez dos galhos pequeninos - tão erguidos, cheios de viço - um fingimento?
Não - eu mesma respondi a mim mesma na medida em que formulei a questão. Tão falsos quanto os caules desfolhados que agora miro, portanto.
Não. A única realidade que me chega neste momento é uma realidade regida por um império, um império da transfiguração.
Não há, em absoluto, nada que permaneça o mesmo na linha do tempo. A ação deste move montanhas relutantes de seu lugar; demove qualquer idéia fixa da mais intransigente das cabeças.
É, a verdade é que nos submetemos todos ao domínio deste imperativo invisível. Erodidos até a medula pelas chuvas torrenciais da alma, não notamos a mudança lenta.
O crisântemo, reparem, morria com lentidão nestas três últimas semanas, diantes dos meus olhos cegos. Com sua resignação de vaso, ele já enrugava suas nervurinhas tenras e caule juvenil a olhos não-vistos.
A morte, percebe?, se esconde em cada fissura e capilar, em cada galho retorcido, envelhecido. Mesmo a pétala recém-nascida e o sorriso jovial da criança carregam-na inoculada.
Cada ruga indesejada, envilecida por nós mesmos - aquelas que escondo com a cosmética tríade imprescindível do pó, base e corretivo - oculta algo que, sem dúvida, é necessário ocultar.
Mas está lá, para quem quiser [e puder] ver.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentam por aí...