Desencaixotando Rita

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sexta-feira, 7 de junho de 2013

O dia em que o céu rachou.

Sonhos apocalípticos nunca me foram raros.

Sempre sonhei com tornados, vulcões, zumbis, enchentes e tsunamis, mas geralmente os sonhos em si não me diziam muita coisa, exceto pela força das imagens, que me aterrorizavam já desperta, me prevenindo sobre o fato de eu ter uma imaginação dramática e dada a catástrofes.

Pois bem, noite passada foi uma noite atípica. De insônia, entrecortada por alguns breves momentos de cochilo - aparentemente não tão breves que não acobertassem alguns sonhos, como eu viria a realizar esta manhã.

Quando acordei, por volta das 5h30, fui acalentada por uma sensação de que, a despeito da cabeça em chamas e do coração desassossegado, em galopes, tudo ia bem. Fiquei intrigada por um momento, para em seguida ser tomada pela avalanche cíclica dos mesmos pensamentos que tiraram o meu sono, em primeiro lugar. A minha própria ladainha interna, infernal.

Após passar pelas diferentes etapas do desespero, seguidas vezes, até o despertador finalmente tocar, levantei para tomar banho, já que a geladeira estava vazia e qualquer esperança de bem-estar físico ou alívio da fome teria que esperar até a padaria, quando eu estivesse de saída para o trabalho.

Enquanto aplico o xampu aos cabelos já sem lavar há dias, pequenos flashes do sonho começam a tomar forma e encadear-se em uma narrativa. A primeira reação que esboço ao reconhecer o seu conteúdo absurdo, como é comum em todos os sonhos, é dar uma risada moderada, quase surpreendida.

Tudo começava com uma festa glamourosa ao amanhecer, em um cais à beira-mar, justamente para comemorar o fato de eu ter ganho uma corrida de skate [!] naquela madrugada, contrariando todas a expectativas, inclusive as minhas.

Segurando as taças de champanhe, eu, minha família e amigos observávamos poeticamente o nascer do sol, quando bruscamente uma sombra se interpõe e o que parece ser um eclipse, com velocidade meteórica se desencadeia diante de nós, escurecendo tudo.
Fascinada, mas com um pouco de medo, assim como todos ao meu redor, eu observo alguns hologramas aparecerem no céu, enquanto este próprio parecia partir-se em dois diante dos nossos olhos.

Uma linha de fogo, quase como a divisão de duas placas tectônicas - caso eu alguma vez tivesse visto alguma - cinde finalmente o firmamento e pequenos vídeos educativos são projetados no céu, para explicar o sentido dos hologramas. O primeiro, que mostrava o planeta Terra em forma quadrada, esclarecia que o universo não existia realmente e que a terra era uma caixa, com começo, meio e fim. E arestas.
O segundo holograma nos desvendava a ilusão da lua, que nada mais era do que a projeção dos nossos desejos. Também não existia.

Em seguida, diversas setas, também hologramas, aparecem no céu apontando para um ponto específico do horizonte e somos informados que todas as respostas para todas as perguntas do mundo serão encontradas lá, naquele ponto.

Exclamações de choque são ouvidas e minha mãe me assegura, trêmula, que já desconfiava de tudo aquilo, pois fazia muito sentido. Neste exato momento, o céu se reconstitui inteiro e o poster de 'O grande Gatsby' aparece também como holograma, notificando que tudo aquilo fazia parte de uma intervenção da equipe de publicidade e produção do filme.
Pasmos por um momento, nos recompomos e rimos de tudo, com algum desconforto.

O sonho estava prestes a terminar, quando eu afirmo em voz alta, enigmaticamente, para todos ouvirem:

- Eu sabia que não podia ser verdade! -  e acrescento:
- As setas apontavam para a direção errada. Eu sempre soube que o sentido da vida estava na direção oposta...

E aponto para um ponto diametralmente oposto ao lugar do horizonte onde os hologramas sinalizavam a presença da verdade.

Começo a despertar, enquanto espero os créditos finais surgirem para encerrar o sonho. Mas nada aparece.
Eu retiro o xampu e desejo nunca ter enveredado pela psicanálise, ainda que de maneira mafiosa, em um dos descaminhos caóticos da minha vida. A tentação de desenovelar este sonho é grande, mas não tenho certeza se quero saber o que  ele significa.




Pintura de Tomie Ohtake



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