Desencaixotando Rita

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terça-feira, 22 de julho de 2014

vênus em uso

conhecerá os ângulos
úmidos
de cada morte miúda
a cada vez, a cada vez,
a
cada
vez,
a cada vez conhecerá a fundo
o estrecimento do núcleo lúbrico
que me parte ao meio
em duas:
a pura delicadeza em fúria;
das nossas pelves conjuntas
escorrerão sucos acidulados
em giros escarpados, sonoros,
até o fim,

e que não haja fim, até que
haja fim, até
que eu diga que houve tudo,
menos fim.

sábado, 19 de julho de 2014

pequenos monstrinhos de olhos verdes de cigana oblíqua e dissimulada

a tarefa
de soçobrar a brasa
na fricção do sonho
é doce
e monstruosa.
fujo, finjo, escapo
aos saltinhos,
corrompida,
por ruas aladas,
engulo plumas, sugo a sujeira
dos dentes
com a língua forcada.
há,
sem dúvida,
nesta carta
que seguro
um punho

aberto
de céu puro
todo e completa
mente seu.

quarta-feira, 16 de julho de 2014

"carta a um morcego-leão por ocasião de um casamento" [às 3h40 da manhã]

Te escrevo a mão, prestes a entrar, pé ante pé, nesta casa de gelosias e biombos imaginários, pois sei que uma vez dentro, surgirei com mais uma, essas que já me são tantas - heteronímicas e pérfidas, doces ou covardes - incontáveis, craqueladas, até agora. Somos duplos e múltiplos, como peixes, meu amor.

          A sua respiração já me frequenta há tempos,
          à distância, antes até mesmo de nos encontrarmos
                   [pela primeira, pela segunda vez?]
          e me vejo obrigada a reorganizar o meu corpo
          ao teu ritmo sonar, à tua pulsão,
                                você, que é tocado pelo fogo

e que secou minhas lágrimas como se nunca tivesse existido
                                                                         água neste poço.


Ainda não sei bem o que fazer de ti, o arqueiro inflável de setas perigosas. Clown ébrio, exu insondável.
Não sei como me manter a salvo de tua sorte jupiteriana e do cortejo bacante dissimulado de caçadoras argentinas, dançarinas de mastro e esguias valquírias, 
                                                                           que andam no teu rastro.
       
Desconheço a extensão de todos os teus nomes, dos meus e dos que virão. O signo do duplo é a nossa casa e nessa casa só se entra uma vez.

Há meses que as moedas se avizinham e anunciam um andarilho. Ouço teus cascos ao fundo.
O baralho deita sobre a toalha da mesa o jogo do prestidigitador, um mago de dedos rápidos e palavras afáveis, carregando livros sobre os ombros e versos sob a pele de lobo.Sim, os oráculos delineam o contorno 
de um marido. É isso o que você é? - me diga

e eu prometo contar-te dos filhos gêmeos que profetizei na noite 

em que pusemos os olhos um no outro.

sábado, 12 de julho de 2014

<>

o resto é paisagem.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

"invernal"

tenho cultivado entre dedos
enregelados
um desejo mineral
de imobilidade

como têm
as primeiras
rochas calcárias

uma existência
exaustiva
de liquens sobre superfícies
erodidas dia após dia, gota
sobre gota hirsuta

[a consciência
do grão se faz lentamente

impermeável sobre mim]

devasta
paragens

de um verão incompleto
e talha fendas interiores
adormecidas como bestas
uma vez queridas